domingo, 28 de março de 2010

Porco agridoce David


Eu gosto muito de comida chinesa ou, pelo menos, de 'inspiração chinesa'. Só que há tempos não preparava um prato, por falta de oportunidade, em razão dos convivas usuais torcerem um pouco a cara para ela, sempre que propunha. Em seguida, quando juntamos um grupinho coeso e disposto a tomar vinho seriamente, da mesma forma, a comida oriental ficou meio de lado, pela dificuldade de harmonização.

Ontem à noite, como combinamos uma "sessão de vinhos" meio improvisada na minha casa, pensei em, finalmente, explorar uma possível combinação de vinhos ocidentais com refeição oriental. O escolhido foi este Porco agridoce, que o Pascoal apelidou de Porco xadrez. Que seja! O nome não tem tanta importância.

Como sempre acontece nas receitas aqui postadas, esta também é muito simples, embora sejam necessárias algumas explicações de termos e condimentos, pois a substituição e adaptação é sempre possível.

INGREDIENTES
  • 500 g de carne de porco (lombinho ou filezinho, de preferência)
  • duas ou três cebolas de bom tamanho
  • duas ou três cenouras grandes
  • meio abacaxi
  • alho e alho desidratado, à vontade
  • molho de ostra
  • shoyu
  • óleo de gergelim ou azeite
  • um alho-poró grande
  • um pimentão vermelho
  • amendoim torrado ou castanha de caju picada
  • hung-liu (pó de 5 aromas)
  • pimenta calabresa
  • maisena
  • açúcar mascavo
  • vinagre de arroz
  • saquê ou brandy
  • katchup
  • gergelim torrado
  • gengibre ralado ou em pó
  • sal e pimenta do reino

MODO DE PREPARAR

1- Molho agridoce

Existem centenas de variações deste simpático molhinho. Esta foi a que achei mais adequada para a proposta da noite. Em uma panela pequena coloque duas colheres de sopa de açúcar mascavo, três colheres de sopa de vinagre de arroz, duas colheres de sopa de katchup, uma colher de sopa de óleo ou azeite, sal e pimenta do reino branca à vontade. Misture tudo muito bem, usando um fouet, e leve ao fogo, mexendo sem parar, até que tudo se dissolva e comece a brilhar. Disponha em uma molheira para que cada um se sirva a gosto.

2- Porco agridoce

Uma das características da culinária chinesa é a utilização de fogo muito forte para um cozimento rapidíssimo dos ingredientes, que ficam cozidos mas crocantes. Assim sendo, se normalmente já é uma boa medida fazer um prévio mise-en-place, ao fazer comida oriental, isso é praticamente obrigatório, pela aceleração que o processo toma em certo momento. Assim sendo, algum tempo antes de começar a cozinhar, é necessário limpar, picar, medir, temperar, separar e organizar tudo o que será utilizado.

Comece com a carne de porco, obviamente. Limpe-a, retirando o excesso de gordura que não for desejável e corte tudo em cubos da espessura de um dedo, mais ou menos. Coloque em uma tigela e tempere com vinagre de arroz, gengibre, pimenta branca, óleo ou azeite, saquê ou brandy e uma colher de chá de maisena. Envolva todos os cubinhos nesta mistura, cubra com um filme plástico e mantenha na geladeira até o momento de utilizar.

Descasque e pique as cebolas na metade e depois, cada metade, em quatro. Reserve. Esta é a parte das cebolas que serão consideradas ingredientes. Metade de uma cebola será considerada condimento e para tanto, deverá ser picada bem miúda, ou ralada. Da mesma forma, pique junto ou amasse quanto alho desejar. Um ou dois dentes são suficientes para a maioria dos paladares. Reserve separado do restante da cebola.

Pique as cenouras com a faca em diagonal e girando a cenoura um quarto de volta antes do próximo corte, para que os pedaços fiquem ligeiramente "piramidais". É só um charminho, não tem nenhuma razão prática. Pode-se picá-las em rodelas retas com o mesmo resultado no sabor. Cozinhe no vapor até que estejam "al dente". Reserve em outra tigela coberta.

Retire as folhas do alho-poró, lave-o abundantemente em água corrente, corte em quatro no sentido do comprimento e depois pique perpendicularmente em fatias de cerca da largura de um dedo. Reserve. Descasque e pique também o abacaxi em pedaços semelhantes. Faça o mesmo com o pimentão. Pique as castanhas, ou retire a casquinha marrom dos amendoins e reserve.

Detalhando assim, pode parecer muito trabalhoso, mas não é. Qualquer cozinheiro tem que preparar previamente o que vai cozinhar. Eu apenas listei as coisas que são feitas quase que automaticamente. Agora é que vai começar a preparação do prato propriamente dita. Será necessária a utilização de uma grande wok ou de uma frigideira igualmente grande.

Escolha a boca de fogo mais potente e aí aqueça a panela. Coloque bastante óleo e deixe-o também se aquecer bastante. O uso de óleo de gergelim é interessante porque ele resiste a temperaturas maiores, sem se queimar. Mas atenção: nos mercados existem dois tipos de óleo de gergelim. Um escuro, que faz parte da culinária árabe, e outro claro, que entra na culinária oriental. Este último é o recomendado, pois o outro foi extraído do gergelim torrado e não suporta tanto calor.

Deste ponto em diante, tudo acontecerá em uma velocidade muito alta. Comece fritando a cebola e alho picadinhos. Segundos depois, a mistura já estará dourada, e é hora de entrar com a carne. Não precisa escorrer a vinha d'alhos em que ficou marinando, mas é necessário mexer incessantemente, a fim de não queimar uma parte, deixando a outra crua. Adicione o molho de ostras à vontade. Mais uma vez, uma ou duas colheres de sopa são o suficiente para a maioria dos paladares. Molho de ostras pode ser encontrado em qualquer loja de artigos orientais e entra em várias preparações que não têm, necessariamente, relação com frutos do mar. É salgado, portanto, cuidado com a quantidade do sal que adicionar posteriormente. Após sua total incorporação, adicione pimenta calabresa à vontade e regue com shoyu.

Sempre mexendo e revirando a mistura, junte sucessivamente, os demais ingredientes, cozinhando-os rapidamente. Ajuste o sal, desligue o fogo, polvilhe com bastante hung-liu e com a castanha ou amendoim e abafe, até o momento de servir. Hung-liu também chamado pó-de-cinco-aromas é um condimento que se podia encontrar com facilidade nas lojinhas orientais. Ultimamente, tem sido mais difícil, mas eu ainda consigo comprá-lo no Mercado Central, em Belo Horizonte. Cada um pode também prepará-lo, misturando partes iguais de anis-estrelado, canela, erva-doce, cravo e gengibre, tudo em pó. Seus aromas são fantásticos, fazendo salivar instantaneamente.

Sirva a refeição com o molho agridoce antes mencionado e com arroz chinês colorido, que nada mais é que um arroz preparado da forma usual, mas sobre o qual se despejou, em fio, um ou dois ovos batidos, pouco antes de toda a água se evaporar.

Ontem nós incorporamos algumas lições importantes relativas à harmonização dos vinhos. Provamos três novos vinhos. Dois Cabernet Sauvignon e um Syrah. Começamos com um Cabernet uruguaio que se revelou perfeitamente dispensável na nossa experiência. É o Dom Pascual Roble. Em seguida, provamos um Syrah argentino muito gostoso, mas cujo paladar nos foi difícil situar. Trata-se do D.V. Catena. O terceiro vinho da noite, e aquele que mais agradou na prova foi o Cabernet argentino Finca Perdriel Terruño. Todas as resenhas, como sempre, estão no nosso blog de vinhos, o Adegazinha.

Quando provamos cada um dos vinhos acompanhando a refeição, tudo foi subvertido. O pior vinho da noite, o Dom Pascual, continuou ruim, mas não piorou e nem comprometeu o que se comia. O vinho que mais havia agradado, o Finca Perdriel, ficou horrível e também deixou a comida desagradável. Já o Syrah D.V. Catena, não só se valorizou, como também valorizou a refeição. Foi um resultado inesperado. Embora imaginássemos que seria difícil acertar um vinho com comida de sabores tão múltiplos e variados, nunca poderíamos suspeitar de resultados tão surpreendentes.

Assim é a vida, não? Quanto mais se vive, mais se aprende. Bom apetite!

quarta-feira, 24 de março de 2010

Linguado ao forno David, com batatas ao murro


O feriado de ontem na cidade foi apenas mais um motivo para nosso pequeno grupo se reunir, comer e beber, claro. A proposta era tomar espumantes com algo leve, numa despedida do verão que se recusa a ir definitivamente.

Lembrei-me do excelente Robalo que meu irmão Silas fez há alguns dias, pedi-lhe detalhes de sua preparação e montei minha própria versão, usando Linguado como base. Só posso adiantar que é o tipo de comida que o gato não come: não sobra pra ele!

INGREDIENTES

  • 2 quilos de linguado
  • 150 ml de vinho branco (usei um Chardonnay chileno)
  • 50 ml de vinagre balsâmico
  • 100 ml de azeite de oliva extra-virgem
  • 3 ou 4 cebolas de bom tamanho
  • um grande pimentão amarelo
  • 1 kg de tomates concassé
  • 1 kg de batatas miúdas
  • alcaparras, à vontade
  • sal
  • pimenta do reino moída na hora
  • uma colher (sobremesa) de estragão desidratado
  • alho desidratado
  • aipo em pó


MODO DE PREPARAR

Caso o peixe esteja congelado ou não vá ser preparado no momento em que for comprado, coloque-o em um refratário e espalhe bastante limão sobre ele. Cubra-o com um filme plástico e mantenha na geladeira até o momento de iniciar a preparação. Este é um cuidado básico de segurança, a ser tomado sempre que se utilizam frutos do mar.

Comece preparando as batatas. Caso não consiga encontrar aquelas batatinha bem pequenas, utilizadas para conserva, escolha as menores que puder. Lave-as minuciosamente e cozinhe em bastante água salgada. Após escorrer a água, enquanto ainda estiverem um pouco quentes, amasse-as com as mãos, ou dê-lhes uma pequena pancada, a fim de quebrar a frágil casca. Organize-as em um refratário que possa ir à mesa, regue com bastante azeite de oliva, salpique sal e bastante alho desidratado. Reserve.

Algum tempo antes de assar o peixe, retire-o da geladeira, lave-o com cuidado, retirando todo o sinal de limão, e prepare uma vinha d'alhos em que se misturam o vinho, o azeite, o estragão, a pimenta, sal e aipo em pó. A "mágica" do aipo em pó é que, com a sua utilização, além do aroma característico obtido, pode-se usar menos sal, o que é sempre prudente.

Corte o peixe em pedaços equivalentes a uma porção e arrume-o sobre outro refratário que possa ir à mesa, e sobre o qual já foi feita uma "cama" de cebolas cortadas à julienne. Salpique sal, de preferência marinho e moído na hora, pimentas, e derrame a vinha d'alhos por cima. Cubra com um novo filme plástico e volte com ele para a geladeira, até o momento de assar.

Antes de levar ao forno, cubra o peixe com mais cebola, o pimentão amarelo e o tomate, também cortados à julienne, salpique mais pimenta do reino, caso goste, e derrame mais um fio de azeite sobre tudo. Cubra com papel alumínio e leve ao forno baixo por 30 a 45 minutos. Depois desse tempo, retire o alumínio e coloque no forno o refratário com as batatas. Eleve a temperatura do forno à máxima e deixe cerca de 15 minutos. Após esse tempo, desligue o forno e deixe os refratários lá dentro, até o momento de levá-los à mesa. Salpique bastante alcaparra e sirva com arroz branco.

O vinho que melhor se comportou com este peixe foi o prosecco Valdo, mas o cava Codorníu também harmonizou perfeitamente.